sexta-feira, dezembro 09, 2005

Trechos de algo eternamente inacabado

Momento

Às vezes olho para o relógio,
quero sentir a tranquilidade
de saber o tempo
saber que ele não pára.
Criar o momento,
observando todos os objectos em redor,
estabelecer um padrão que não existe
porque é único e irrepetível

E por vezes olhar de soslaio
para o que acabei de observar,
procurar outra perspectiva, tentar identificar
um sentido, algo de palpável
que nunca lá parece estar;

Mas não vale a pena, porque
já passou.
nada interessa quando já é passado,
passará a ser apenas mais um artefacto de areia
na memória.
E à medida que o tempo passa,
o vento vai transformando-os
em dunas, em cinzas
em vestígios de algo imperceptível

Porque a estrada parece ser única
e tem apenas um sentido: em frente.
Os desvios surgem quando sem querer
olhamos para o lado, e
por apenas um instante,
fazemos um desvio.
Para a mente o imperceptível não existe
e assim, a estrada continua
em frente
em direcção ao horizonte,
ruma sempre ao horizonte.

_-_-_-_-_- / / -_-_-_-_-_-_-_

Nota: este a seguir é o meu preferido


Despertar

Penso e acordo
Penso no que estava a pensar
Estava a sonhar
que tinha um pensamento

Mas em que pensava durante
um sono?
Não me é definido,
não foi um pesadelo,
não foi um sonho.
Estaria acordado?

Não sei.
Penso mais um pouco...
...e acordo.
Que sonho foi este que tive?
Vou pensar...

P.S: estes textos são dedicados à Ana, cuja pressão me pôs a escrever outra vez.
O que não consegues pela desígnio fundamentado, conseguirás pela perseverança, caso contrário, pode-se sempre falar do tempo.

sábado, julho 09, 2005

Direito de Pensar

Um ser humano tem necessidades, tem ímpetos pessoais. Procura-se o melhor de nós mesmos, descobrir a nossa mente e reinventarmos a nossa maneira de pensar. Poderá não priveligiar o futuro, mas permite uma auto-aprendizagem que em tudo nos faz evoluir.

Mas que é feito do tempo?
Olha-se para trás e vê-se a Antiga Grécia, vê-se Platão a deambular a ensinar, a dialogar com os seus alunos, os seus súbditos. Ele acorda de manhã, passeia-se pelo prado de sandálias com a mão a contorcer a barbicha e a pensar…a teorizar. Depois confrateniza com os seus, debate, aprende. Naquele tempo tudo era simples, as uvas eram fartas…havia tempo.
Sendo o Homem tal figura de evolução, a sua necessidade de se auto-superar resultou em marcos históricos, em invenções que melhoraram a qualidade de vida dos que delas usufruíram.

Tudo o que é inventado tem como objectivo o retirar fardos às pessoas, a facilitarem a sua vida para que tenham tempo para fazerem outras coisas, para se reinventarem.
Mas sendo o Homem tal figura de evolução, esse tempo é absorvido pela tal busca de algo mais. Porque é que raio não se pára? O futuro pode esperar, porque queremos tudo e queremos já? Não mais parece haver tempo para parar.
Enquanto que naquele tempo (Antiga Grécia) as aulas era o puro debate argumentativo de ideias sob o solarengo pôr-do-sol, agora devido ao crescimento da população e a inventividade de todos estes anos levou a uma alteração de sistema de educação, no qual os conhecimentos são maioritariamente impostos pela figura mentora: o professor.

Não estou a criticar, apenas quero salientar a enorme discrepância de aprendizagem, pois actualmente é tal a parafenárlia de metas que foram cruzadas, de objectivos que foram atingidos que faz com o comum estudante não se deixe de sentir minimamente frustrado.
Pois é…tornamo-nos vítimas do nosso próprio sucesso. O nosso período escolar é passado a internalizarmos mais nomes que acções. Somos confrontados com os feitos de outros constantemente e tal deveria ser contrabalançado. O incentivo ao pensamento subjectivo, o ensinar a pensar tem de ser fundamental para que o peso dos antecedentes não nos espezinhe.
Independentemente de tudo isto, em que pé estamos? Quando as coisas eram simples, havia tempo para pensar, agora que tudo se fez para que nós tenhamos cada vez mais tempo: máquinas de lavar, cozinhar, transportar etc continuamos sem tempo para o que nos satisfazia nos primórdios: pensar por nós próprios, debater ideias, dialogar, raciocinar.

Mesmo sem querer, sinto-me mal quando deveria estar a estudar e estou a ter uma conversa filosófica com um amigo. Chego a dizer a mim mesmo “Que perda de tempo, podia estar a estudar”…ora eu não quero viver num mundo assim. Qual é a pressa? Porque sentimos que o que nos rodeia mais directamente nos ocupa o tempo inteiro? Sem espaço de manobra sou um recluso da minha própria vida.
Como se tudo isto não bastasse, entre as invenções, algumas fazem as pessoas crer que pensar por si só é trabalho e é escusado, pois a televisão entre outros meios entrega a informação directamente, por isso nem tal requer engenho para ser obtido. Embora de extrema comodidade, tal vai-se tornando um handicap, pois qualquer músculo se não for exercitado arrisca-se a atrofiar. E embora estudemos e obtenhamos os nossos diplomas, o caminho que a sociedade contemporânea nos leva é a de total especialização no qual o debate de ideias fora da área de especialização se torna medíocre pela tal falta de capacidade de pensamento subjectivo e interior.
Quando digo que gosto de filmes que me façam pensar é apenas juntar o útil ao agradável: qualidade de vida e exercitar a massa cinzenta…

Tudo o que digo é racionalização para o bem da nação, não queremos certamente ser uns meros escravos da nossa própria existência e com falta de imaginação, será concerteza isso que acontecerá.

quarta-feira, abril 27, 2005

Escondidos na colina

Sim, o branco inebria, ofusca e torna-se parte de nós.
Existem dois mundos que se conjugam e se tornam um e é o tempo que os define: a manhã e a noite. O lusco-fusco é o espaço mítico no qual a transição se processa.
Estou muito simplesmente a falar do acontecimentos aparentemente inexplicáveis que ocorreram em Pas de la Casa. Isto é um tema polémico, controverso e sobre o qual não há qualquer tipo de documentação fidedigna, embora seja algo que nos ultrapassa, que atravessa gerações a fio e cujas consequências são tão macabras como incorrigíveis.

Do que falo afinal? Dos cavalos carnívoros, ursos herbívoros, as inevitáveis prostitutas que nascem por esporulação entre outras monstruosidades que se encontram dia sim dia sim no offpiste, e algumas mesmo nas próprias pistas.

São temas abordados por entre os Gatos Fedorentos e o incomparável Dr. Vitominas ("Não aperta, não aperta!!"), primeiro timidamente, depois exaustivamente, durante as maratonas de Uno.
Por entre o intenso baralhar de cartas, os testemunhos vão surgindo e as peças vão encaixando.

Observam-se estranhos fenómenos na superfície branca, naqueles horizontes escondem-se muitos mistérios na penumbra. Os cavalos carnívoros possuem uma penugem que os permite esconderem-se que nem um camaleão por entre a vegetação e algumas sub-espécies do equus carnivurus camuflam-se também nos rochedos intercalados entre as pistas. As suas presas cheias de sangue são letais para os esquiadores inexperientes.
De noite repousam e preparam-se para o amanhecer. O seu faro detecta o som a vários metros graças a uma interligação dos sentidos o que os torna os seres mais endémicos da montanha.

São seres muito pacientes e muito particulares na sua demanda: esquiadores que caem perto dos limites das pistas são silenciosamente arrastados para a sua zona de camuflagem. Contudo, não são animais muito fortes e cansam-se facilmente devido aos cascos. Foi uma característica que não sofreu a evolução desejável dadas as condições do seu habitat, infelizmente para nós, o seu encéfalo desenvolveu-se imenso e por isso esse "casco de Aquiles" é compensado com massa cinzenta: são muito inteligentes.
Consequentemente, fazem acordos com as prostitutas que nascem por esporulação

O André ri-se malevolamente enquanto dá mais um "apanha 4" ao Miro...penso que já soma 34 cartas apanhadas à conta do André. As risadas prolongam-se que nem uma reacção em cadeia e as mãos do Miro bem se contorcem sobre o pescoço do André...mas é escusado.

As prostitutas que nascem por esporulação (PQNPE) são uma aberração da natureza que nasce em qualquer ponto da montanha, eclodindo de um esporo e atingindo o seu estado maduro, com as ligas pretas e meias rendadas poucas semanas após a esporulação. O que acontece é que os cavalos endémicos muitas vezes tropeçam desastradamente nos esporos e devido a isso, desde os primórdios que têm um acordo com as PQNPE, no qual elas agem como manobra de diversão aos esquiadores menos precavidos e fascinados pela frescura física destas prostitutas.

Já perto do fora de pista, no momento mais vulnerável, chegam os cavalos carnívoros endémicos e zás!! Ferram o esmalte e partilham as vísceras com as PQNPE. Elas gostam particularmente do baço devido ao sangue velho que por vezes ainda contém.

Este acordo remonta aos tempos em que as quedas fora de pista começaram a diminuir devido ao aumento do número de professores nas estâncias de esqui e para evitar a extinção, usou este estratagema para obter o sangue que tanto necessita.

Os olhos já comem as cartas do Uno de tanto sono que temos. As fugas a estas bestas durante todo o dia deixam-nos exaustos, mas no entanto uma estranha força leva-nos a baralhar e a distribuir as cartas ainda mais uma vez.

Mas perguntarão vocês certamente: e os snowboarders?? Será que o Tibas é um faccioso que é só ski, ski, ski e deixa inadvertidamente a malta da tábua de fora???
Não meus caros, o que sucede é que até os cavalos endémicos precisam de protecção, das criaturas mais imprevisíveis e rápidas da colina branca: os morcegos brancos fastidiosos.

Estes seres habitam em plena pista e nascem às centenas por dia, aliás, são eles a principal razão para que as máquinas alisam as pistas diariamente, para controlar a natalidade dos morcegos. Eles deitam-se na pista com as presas fincadas na neve a sentir as vibração do solo para poder atacar. O pormenor interessante é que só captam sons muito característicos que são da prancha de snowboard, que parece o som de um tubarão, ou seja, apenas detecta snowboarders experientes, por outro lado também detectam o som de cascos na neve.

O que sucede então?? É por esta razão que os snowboarders com experiência optam mais em andar fora de pista, de modo a evitar as presas assassinas dos morcegos brancos e os cavalos endémicos associaram-se aos ursos herbívoros, que vivem escondidos nas escarpas e não representam perigo por causa da sua alimentação vegetariana.
Os cavalos fornecem os esquis e apenas esquis aos ursos herbívoros que nascem por gemulação, para eles palitarem os dentes, pois a vegetação das montanhas é agreste e os castores demoníacos à muito que estão extindos em Andorra. Em troca, os ursos protegem os cavalos assassinos das presas dos morcegos brancos e assim o ecossistema vai sobrevivendo.
Apenas muito raramente os morcegos brancos, cavalos endémicos, prostitutas que nascem por esporulação e ursos herbívoros perturbam a ordem natural comendo-se uns aos outros quando Mercúrio passa por Vénus em noite de Lua cheia, o que apenas sucede de 150 em 150 anos.
Pelo meio disto tudo por vezes surgem os corvos assassinos cuja maior predilecção são os olhos. Estas aves não são preconceituosas e atacam tudo, incidindo maioritariamente em praticantes do sky nórdico pela sua fraca mobilidade. Adoram bicar as retinas e apenas aparecem durante a época baixa, de modo a passarem mais desapercebidos.

Já não dá mais...vai tudo dormir, porque a luta não pára e amanhã há novas pistas para desbravar. Espero que este texto vos sirva de guia numa visita à neve. Os mistérios continuarão na penumbra...o misticismo perdurará. Sejam amigos dos animais, mas olhem que as prostitutas...dizem que vale a pena, pelo menos os poucos que sobrevivem e vivem como eremitas o resto da vida.

--> Este documento é dedicado ao André “3º Reich”, Raquel “skystar” Paços, Ricardo “Miro” Casimiro, Catarina “Catxy” Saramago e João “Bitoke” Santos...que as férias de Pas de la casa se repitam por muitas vezes.

Abraço forte forte forte

sexta-feira, março 18, 2005

A montanha de neve

Desde à uns 6 anos que vou uma vez por ano à neve, principalmente a Andorra. Não há nada que se lhe compare, ao ponto de não trocar aquela semana por nada. Para variar um pouco, este ano são 2 semanas...para testar o enfastio.
A paisagem muda radicalmente, irrompem as montanhas e os últimos 100km que as circulam e trespassam. São os piores, mas os olhos e a música amenizam e até põe para segundo plano as intermináveis curvas. Aos poucos e poucos a neve vai surgindo nos cumes e o ocre vai sendo substituindo pelo inerte e ofuscante branco...estou a chegar.

O maior esforço é sempre no primeiro dia, quando se insere o pé, qual chispe rijo e olvidado. As botas de sky adormecidas à 1 ano demoram a despertar e os primeiros calores aparecem ainda antes de se chegar às pistas.
Ao colocar os esquis próximo do meio mecânico, a mente parece que já está nostálgica e a sensação de dejà vú é continua: a neve parece sempre a mesma, mesmo que a estância seja sempre diferente. Relembra-me a primeira vez que coloquei os esquis, numa pista tão pouco inclinada que já perto do fim se tinha que empurrar com os bastões para chegar a um dos dois puxa-rabos que aquelas duas pistas tinham.
Falo do Parador Canaro, a caminho de Pal vindo de Andorra la Velha. Eram uns apartamentos à beira da estrada, com uma esplanada e aquelas duas pistas com inclinação de 10 metros, que no mundo branco é uma anedota...uma das que me faz sempre rir antes de encaixar as botas nos esquis.
Nenhum outro desporto me faria acordar tão cedo de manhã, mesmo sem qualquer preparação física, os resultados são os mesmos. A tranquilidade, mesmo por entre os gritos de regojizo e risadas, é insuperável...o ar toca no som de uma maneira que faz parecer tudo música e o inspirar fundo ganha novo significado.

Não há retrocesso nem tão pouco estagnação, pelo contrário, há uma constante evolução da técnica e mais importante ainda, há uma renovação do prazer...sem o mínimo sinal de tédio. Até parece que estou a vender o meu peixe...congelado, mas a catarse é assim.
Mesmo assim, pensei que esquiando o dobro consecutivamente me iria deixar minimamente agastado, mas o que aconteceu foi que a cada dia que passava, a fluidez era maior, assim como o prazer. Contudo, também é de notar que o tempo melhorou de dia para dia, assim como o companheirismo.
Como estava num nível acima dos colegas com quem me dou mais, andei algum tempo sozinho. Ao princípio receei, mas pouco depois já estava a adorar e esse sentimento não se alterou, pois nunca me sentia isolado, pois é um desporto individual, ouvia a minha língua constantemente e a paisagem, o ar, a pureza...havia sempre algo para desfrutar, algo que só pode ser comparável às ondas do mar no crepúsculo. E o sibilar dos esquis a planar na neve, aquele som, aquela sinfonia...faltam-me os adjectivos.
No último dia, manhã cedo, senti que poderia ali ficar outro tanto tempo, então forcei mais durante o dia, para não ficar remoer. Saí das pistas de rastos, exausto, de nariz luzidio, mas acima de tudo...feliz.

Mal posso esperar pelo ano que vem...Pas de la casa não será inolvidável.

terça-feira, fevereiro 01, 2005

Reversed 96

Reversed 96 trata-se de um projecto musical iniciado por mim e uns amigos meus (Samuel Traquina, Hugo Rilhó entre outros) como meio de expressão do espontâneo. Começamos a tocar sem ensaio e gravamos... Algumas são más e enfadonhas, outras são apelativas, mas em todas há momentos que me fazem sorrir, por vezes sem saber porquê ao certo. Jam sessions.

Sem qualquer desejo de comercialismo, são apenas tardes bem passadas...
Vou aqui publicar a letra de uma dessas músicas sem título, a qual foi feita no momento da gravação, como de resto acontece sempre. Escolhi esta pela fluidez com que me saiu, e embora possa parecer enfadonha, na música tem um tom que a torna mais suportável

All the things real i feel

These kind of people
that live along these years
They don't get with each other
They fall away
Although, i can't disguise it

Lonesome years now
It's been a long time since that
Gold years, old school
Drfting away with the wall
with the mirror of you

It's not just the sex
it's lonesome years
Lonesome old years

Daisy's got a flower, but what?
You can't receive it
You can't plant it
It's doomed to die
You can put it on a vase
you can put it anywhere
but it will always die...

I hope it...can die away from me
Don't want to take the blame
wanna stay here

So i guess i have to
keep following you everywhere
The flower, the flower of life
The flower!
Loves me so
Loves me not

Jumping ahead of things
Looking along the path
And all that you've seen, that you've done
Are there
They seem gone
But they are there

History tells you a lot of things
They pass by you but they're written
everywhere
You're the resuld of those things

You're a thing

(...)
All you think is real in this world
May be, maybe not
It's electricity, electricity
Flowing all around you
Disturbing, discovering
all the mean bad things you do

Man, you've really opened the Pandora's box!
All the pledges...bad
evil all around the world
Opening, open, open
the Pandora's box
Pandora's box open, now what?
Pledge, pledge!
It's all just real stuff that pledge
Surrounding you

Can't do anything,
just have to live with it
like most things
efemorous life, likewise
The truth beneath
The light approach

And along the way
Look to me i'm over here
I'll be waiting
I'll be waiting alone for you now

The cafè is always open for you
Meet me there after dawn
when it's dark (...)
Bulimic point of view
in a stormy day
The shine is up in the sky
Covered with clouds
Creating a mist, a crazy fog...
surrounding your mind

Feel the landscape
It's here, it's there
It's everywhere
Can't run, can't hide
I'll be there
You'll be there
It's universal

(...)

Caught under delieverance
You never know where you are
until you get there
but you don't wanna get there
'cause when you get there, you're gone
So be away

Like in a forest, you don't see
through the bushes
through the ambiguitities of life
Plenitude is what we seek
but before that
we get old, and old, and old
we get older and wiser
wiser and weaker
physically damaged

I guess the mind always works
the mind is always there
feeling anxiety
towards the end
(...)
Don't go away
You can't hide, you can't hide
'cause i'll find you
wherever you are
at the cafè of life

seeking plenitude, knowledge
and all the rest
consuming it in my chest
Discovering all the wonderful things in life...
but it's over, it's over, it's over
but it's not over, until it's over...

P.S: A música tem 10 minutos...






domingo, janeiro 16, 2005

Soon this space will be too small

Diz-se que a única coisa certa na vida é a morte. Não é interessante que o que dá mais dá importância à vida seja o seu fim? Não quero entrar naquelas tretas transcendentais do pós-vida ou do pós-morte. Porquê?
Do que vale questionarmos sobre o que nunca saberemos, ou se o soubermos será na devida altura, não... o que me faz divagar é o que a morte influencia a vida. Os porquês são um mistério.

Sendo um homem inserido nos preâmbulos da Ciência, sei sem problemas justificar a existência da morte. É muito simples o encerrar de um ciclo que começou com a reprodução e como o planeta não aumenta, é natural que haja uma renovação de população. A Ciência será con certeza a melhor bananeira para encostarmos as nossas dúvidas existenciais...a lógica é exímia. Também há a razão biológica, ou seja, nenhum corpo sustenta vida eternamente, pois com o passar do tempo as estruturas que o constituem se fragilizam.
Surge o dilema: quando começa a fragilização? No útero há o desenvolvimento, nesta fase há crescimento, mas será que começa logo aqui o começo do fim...que deprimente. Certo é que é uma máquina milagrosa o nosso organismo, mas até o mais perfeito dos engenhos está sujeito às regras do universo, mas não vou por aí.

A verdade é que sendo a célula a unidade funcional de qualquer sistema vivo, será ela própria um sistema vivo, o primordial aliás. Existem outras definições, mas esta é a minha favorita: a definição diz que que um sistema vivo tem a capacidade de se manter num estado longe de equilibrio como meio de obter energia para crescer, se multiplicar usando ao seu dispor matérias fornecidas pelo ambiente.

Assim sendo, o passar do tempo faz a máquina perder traquejo e como há um encadeamento de reacções e processos que permitem a Vida, basta a mais pequena das coisas falhar para despoltar uma reacção em cadeia que, mais tarde ou mais cedo, resulta na morte.

Ou então vais a acender um cigarro, sem notar o carro descai um pouco, o suficiente para um camião te passar por cima...

Mas todos queremos mais, lá no fundo, não chega, por isso arranjam-se meios de encarar o inevitável. Uns optam por estar sempre preparados, tipo os estóicos. Tendo a morte como certa, porquê mexermo-nos, amar, pensar, quando no fundo, não passa de uma espera. Para eles, a vida é uma transição que termina com a morte. Ironicamente outros pensam que a morte é a transição para outra vida, que o fim não passa do começo.
Assim, muitos despojam-se de bens materiais e procuram algo em si mesmos e no que os rodeia. Não sabem o quê, mas sabem que está lá ou cá dentro. O problema é que a mente é traiçoeira, pois o que te define num momento pode ser contraditório no instante seguinte. É como um peixe tentar morder a própria cauda. É como achar que o que buscamos é o nosso próprio cu e não ter um espelho e necessitarmos de ver para crer. No fim, lá vês o teu cu e descobres que não era isso... parece ser perturbador.

No outro extremo está o carpe diem "aproveita o momento". A premissa do tempo ser curto, e por isso usufruir dele do melhor modo que acharmos possível.

Entre uma e outra há "n" prespectivas entre as quais, a clássica vida após a morte onde se supõe o paraíso, o nosso melhor sonho elevado à eternidade e plenitude, o inferno... Todas estas são meios de tornar a vida suportável, retirando-lhe o peso da forte possibilidade de ser a única e daí, mais relaxadamente, retirar mais prazer dela.

Chegou o momento da minha prespectiva favorita, que é tão plausível como qualquer outra.
O início é e será sempre a célula, o embrião, o feto. A partir de certo momento da vida intra-uterina, já teremos capacidade para pensar. Que mundo fantástico! parece planctòn, sou um ente em suspenção na minha placenta. Tenho um cordão umbilical, não espero nada mais, sou puro! Sou perfeito!! Mas isto está a ficar pequeno, pequeno demais para mim e o meu crescimento. Meu Deus, será isto o fim? Mas não, vejo uma luz brilhante, estou atónito, não tenho para onde fugir. Já não estou em suspensão e ahhh!!!! Saí!!! Caminhei para a luz e estou fora do meu mundo.

O nascimento não é muito diferente da morte e do pós-morte. Quando chegar a minha hora, este mundo será demasiado pequeno para mim, começo a ver uma luz brilhante e o meu futuro ex-mundo está cada vez mais longe, olho para trás e já só é um ponto preto, cada vez mais pequeno e ahhh!!!!

Foi o pai de Lhasa de Sela que tem esta teoria, aproximadamente. Está cantada em "Soon this space will be too small" do seu album "Living Road".




Estou curioso mas não estou ansioso...




P.S: Afinal entrei nas tretas transcendentais do pós-morte, porquê? Porque sou humano e não consigo parar de pensar

segunda-feira, janeiro 03, 2005

Como que em câmara-lenta

À noite a pupila dilata-se
Fico mais vivo
Pessoas passam na rua
Ouvem-se os passos
Começa a chover,
o instinto diz que me abrigue
Oiço gritos, não sou o único
Pessoas procuram abrigar-se
Um velho não se apressa
vai devagar, evitanto as poças de água
Duas jovens riem-se
uma ergue o seu casaco e correm
correm, procurando tecto
Os seus saltos altos ecoam
quase acima dos risos e vão cegas
pisam todas as poças
molhando-se ainda mais
rindo-se ainda mais
correndo ainda mais

Perco a noção do tempo
gotas de água escorrem-me pelo rosto
e caem desamparadas no chão
espargindo
Dando conta da minha imobilidade
Corro em busca de refúgio
Quando lá chego, pára a chuva
Apercebo-me que tenho um chapéu de chuva na mão...

Antes do crepúsculo

Dia: 23 / 09 / 2002
Hora: 06:34

Põe stop no discman ao se aproximar da soleira da porta. O som de Kid Loco, A Grand Love Story ainda lhe ecoava nos ouvidos enquanto introduzia a chave na fechadura o mais silenciosamente possível, achando até estar a fazer um novo recorde de abrir e fechar a porta sem ruído.

A escuridão atordoa-lhe ao princípio, devido à ausência da lua cheia que estava lá fora, mas aos apalpões encontrou o seu quarto. Ligou a luz com firmeza e começa o ritual de mais uma longa noite (another late night) que já se tornava um hábito.

Começa por tirar o chapéu azul impermeável que foi útil para os aguaceiros nocturnos. De seguida tirou o discman e casaco bèje. Tirou a roupa toda excepto os boxers e as meias e pôs-se a pensar, com os olhos fixos no armário de livros que tinha ao lado da cama.

Repentinamente, viu que o livro de pensamentos, o confidente de capa escarlate, o futuro livro de memórias...e decidiu escrever algo, pois já não o fazia à um tempo. Mas alguns obstáculos se prespectivavam: não tinha caneta e o livro estava fechado à chave no armário. Assim o eram devido à necessidade de silêncio no decorrer de toda a operação.

Começou por abrir a primeira gaveta da sua mesa de cabeceira para procurar uma caneta. Sem ruído, encontrou uma que nunca tinha visto, nem sabia que tinha: branca e amarela, propaganda médica.

Logo em seguida, retirou a chave do armário, que estava enfiada numa das portas e inseriu-a cuidadosamente na porta que encerrava o dito livro. Chave essa que tinha pendurado outro artefacto de propaganda médica, um proteus peluche cor-de-laranja.

No momento do clique da abertura da porta, tossiu para abafar o som e retirou o livro vermelho. Calmamente, deitou-se na cama e escreveu este texto, lembrando-se do Fabuloso Destino de Amèlie Poulain, filme que tinha acabado de ver perto das 6.00, ecoando-lhe na cabeça ainda Kid Loco.

Lembrando o ano desastroso em termos académicos, o Sudoeste e um bom final para este infindável e aparentemente enfadonho texto... (suspiro).

Dia: 23 /09 /2002
Hora: 7.00

A espontaniedade do fascínio Posted by Hello